quinta-feira, 5 de julho de 2012

ANTÔNIA - 3


Fui para a rede chorar um pouco. Eu tirei a rede do pai e da mãe e troquei por mais duas galinhas há três semanas. Sei que daqui a pouco vou ter que matar as galinhas para a nossa alimentação. Não sei fazer esses animais se multiplicarem, tampouco fazer um plantio de mandioca ou de milho se transformar em uma fonte de renda para a gente. Sou uma menina ainda, não sou adulta!
Muitas responsabilidades foram colocadas em minhas costas antes mesmo de eu ser mulher! Será que ninguém pode me ajudar? Não é necessário ajuda financeira, apenas dar instruções de como pode ser feito…
Há um homem na cidade que é muito inteligente. Sempre que vou trocar leite por feijão, vou até a venda dele. É o único que aceita esse tipo de troca. Outro dia eu pedi a orientação dele. Ele me olhou de cima a baixo e disse umas coisas que não entendi. Só sei que não gostei do seu olhar, achei muito esquisito. Meu pai nunca me olhou daquela forma…
Os anos foram se passando e nossa vida sempre na mesma, ou melhor, piorando cada vez mais.
Eu não poderia deixar a minha irmã passar fome, mas naquele lugar a gente iria morrer. Resolvi, então, fazer uma tentativa. Era a única saída, não tinha outro jeito. Fui até o nosso vizinho, aquele que ajudou a tirar meu pai morto da árvore. Pedi que ficasse cuidando da Márcia, pois eu iria para outro estado tentar a vida. Do jeito que estávamos, não teríamos nenhuma chance de sobrevivência. Essa era a única luz que eu via no fim do túnel. Prometi que enviaria dinheiro para ajudar nas despesas dela. Eu me sentia mais segura deixando-a com uma família. Arrumamos suas coisinhas, tinha pouquíssima roupa e apenas um par de sandálias. Coloquei em duas sacolas e levei-a para casa da Zefa. Meu coração apertou tanto que não contive as lágrimas. Sofri muito ao deixá-la, mas tinha que ser assim.
Pedi ao Seu Dito para vender a casa, mas não tinha documentação nenhuma. Lá, naquele fim de mundo, a gente conversava e fazia negócios à base de palavras. Nossa palavra tinha muito poder e confiança. O dinheiro que ele conseguia era para suprir as despesas da Márcia. Minhas coisas deram apenas em uma sacola. Prendi meu cabelo com um elástico e fui para a estrada, a fim de pegar uma carona. Levou mais ou menos duas horas para passar um caminhão. Fiquei esperando naquele sol ardente que comia a nossa pele. Enfim, a carona chegou.
Um senhor parou e entrei em seu caminhão vermelho, enferrujado, todo coberto de terra e tão quente que mal dava para respirar. Ele era muito simpático, lembrava meu pai… Tenho saudades de meus pais. Eles fazem muita falta. Cheguei à cidade grande. Era grande mesmo.
Pessoas lindas circulando pelas ruas. Havia carros por todo lado. Fiquei um tanto assustada. Não tinha muito dinheiro, apenas duzentos reais para arrumar um lugar para passar a noite e conseguir um emprego. O senhor do caminhão me disse que conhecia um albergue que aceitava meninas, era barato e eu poderia passar a noite lá.
Ele me deixou na porta. Era um lugar feio, todo sujo. Pessoas estranhas passavam por ali, diferentemente do centro da cidade. Tive sorte, havia um quarto vago. A mulher da recepção primeiro quis o pagamento da diária, para depois me deixar entrar. Coloquei a minha sacola dentro de um guarda-roupa de duas portas todo descascado.
A cama era pequena, o colchão duro, porém, não fazia diferença para quem dormia em rede. As paredes eram beges, tinha bolor, toda descascada, não valia o preço que pediam na diária, mas era tudo o que eu tinha. Viajei o dia todo e quando cheguei já era noite; queria descansar um pouco. Naquela noite, antes de desmaiar de tanto sono, chorei… estava me sentindo sozinha e com medo daquela cidade imensa.
Continua na próxima terça-feira

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