quinta-feira, 7 de junho de 2012

MARINA - CAPÍTULO 12


Costuma-se colocar flores para o defunto não cheirar tão mal, mas eu estava fedendo tanto que acho que nem o perfume daria resultado.
Cheguei no hospital e o doutor Tadeu estava me esperando. Entrei na sala dele levada por meu pai na cadeira de rodas.
Ele quis fazer brincadeiras, mas eu sabia que estava morrendo.
- E aí menina bonita como está?
Eu só não sabia onde estava a menina bonita… careca, pele enrugada, dentes podres, gengiva sangrando, fedendo defunto… só podia ser brincadeira dele.
Ele abriu os exames e tudo estava na mesma. Chamou minha mãe e meu pai em outra sala, demoraram uns minutos e voltou apenas minha mãe com o médico. Perguntei do meu pai, mas ele ficou lá fora, foi no banheiro lavar o rosto. Ele deveria estar chorando.
Fiz que não era comigo e perguntei ao doutor o porquê minhas veias estavam doendo tanto. Ele explicou mas eu nem prestei atenção em nada, queria é ficar curada.
Minha mãe entendeu e quando chegou em casa colocou em prática o que ele ensinou.
Esquentou água e fez um chá de camomila. Com um pano limpo, mergulhou no preparo e colocou sob minhas veias escuras e duras. Doía tudo. Eu sentia o câncer comendo meu corpo, cada pedaço. Eu sabia onde ele estava, onde era apodrecido por essa maldita doença. Naquele momento meu intestino, meu fígado, rins, esôfago, baço estavam sendo comidos pela doença… eu sentia cada parte do meu corpo morrendo…

Numa noite, eu pensei que era meu pai entrando no meu quarto, um vulto escuro. Eu não estava enxergando mais quase nada. Meus olhos estavam embaçados. Alguém  falou que viria buscar minha alma naquela noite… eu sei que não era Deus nem um dos seus anjos, porque a voz era horrorosa e o cheiro de enxofre era grande. O temor sobreveio sobre mim de tal forma que consegui dar um grito, ainda não sei como fiz isso, acho que foi o desesperado.
Minha mãe entrou correndo no quarto, acendeu a luz e veio até minha cama. Segurou minha cabeça e ficou me olhando com os olhos arregalados. Eu não disse nada. Ela me falou que Jesus ainda me amava mas a mágoa tomou conta do meu ser e isso fez o câncer em mim. Ela me disse que o médico deu apenas uma semana de vida, e o prazo estava se esgotando. Se eu não perdoasse quem me fez ter mágoa,  iria para o inferno.

“Pelo que já se escureceram de mágoa os meus olhos, e já todos os meus membros são como a sombra.” Jó 17:7

O problema é que eu não conseguia perdoar! Eu não conseguia ! Quando  me lembrava daquelas palavras que não ia dar certo  ficava com mais ódio ainda. Sentia uma raiva muito grande daquela situação, eu estava morrendo, literalmente morrendo. Tinha apenas alguns minutos de vida e não conseguia perdoar!!
Quanto desespero, quero dar o perdão mais não consigo! Sinto minha alma indo para o abismo! Alguém pelo amor de Deus me ajuda! Não tenho forças para falar nem para orar!
Minha mãe percebeu a minha agonia,  sabia que eu estava morrendo. Minha boca começou a sangrar novamente, o cheiro de podre estava insuportável que nem mesmo eu conseguia me aguentar. Meus olhos estavam se fechando… estava esgotando minha vida aqui na terra…
Minha mãe desesperada disse para eu falar o nome da pessoa na qual tinha rancor. Eu não conseguia falar o seu nome…
Ela largou a minha cabeça e se levantou da cama. Me disse:
- Se o Felipe realmente te amasse, estaria aqui no meu lugar e não com outra pessoa. Se você tivesse se casado com ele, hoje também estaria com outra mulher. O problema é que você não entende que a gente quer o teu bem e te aconselha para que não caia no erro. Mas a sua cabeça é muito fraca para compreender o amor de Deus. Quer morrer? Faça conforme a sua fé! Agora você viu realmente que ele não era para você e ainda assim tem mágoa. Mágoa de quem? Da verdade?
Minha mãe saiu e me deixou no quarto sozinha…
Naquele momento parece que recuperei a consciência. Comecei a pensar. Por alguns segundos consegui pensar. Eu estava sem ar, não tinha mais respiração. No meu último folego disse em voz sussurrada:
- Deus, eu perdoo meu pastor e perdoo todos aqueles que eu pensava querer o meu mal.
As palavras saíram do fundo da minha alma…
Continua ...

Nenhum comentário:

Postar um comentário