terça-feira, 29 de maio de 2012

MARINA - CAPÍTULO 11


Cada dia de quimioterapia, um sofrimento. No hospital que eu realizava a quimio, tinha muita gente como eu. Uns estavam bem, outros estavam morrendo. Vi muita gente morrer em minha frente ou mesmo fiquei sabendo que morreu por algum enfermeiro. Crianças sofrendo, pais chorando, a dor por todo lado. O diabo reina nesses lugares e eu que um dia fui usada por Deus, expulsava-os das pessoas, não consigo expulsa-lo da minha vida.

Um dia senti muita falta de ar. Não consegui nem gritar, tinha uma colher perto de mim eu a joguei com o restante de força dos meus braços em direção ao corredor. A Bá veio correndo e ficou desesperada. Eu já estava ficando roxa. Ficar sem ar é algo horrível. A agonia de querer respirar e não conseguir. Puxar o ar e ele não vir. Ela gritou e meu pai veio correndo. Me pegou no colo e me segurou em seus braços. Minha mãe pegou as chaves do carro, a Bá abriu o portão e quando vi já estava na cama do hospital recebendo oxigênio.
Vi meu pai saindo pela porta chorando. Minha mãe segurando o aparelho de oxigênio em meu rosto. Seu olhar era de toda tristeza do mundo. Eu sabia que se ela pudesse estaria no meu lugar para me dar a vida de novo. Me sentia bem quando ela estava ao meu lado porque os demônios sumiam, mas quando ela não estava, eles ficavam ao meu redor só esperando a minha morte, como fizeram com a menina do hospital.
Meu médico entrou e pediu novos exames. Foi tudo rápido. Eu não fui  para casa, fiquei para receber sangue…
Ouvi a Bá ligando para alguém pedindo que arrumasse pessoas para a doação. É que quando se usa o sangue do hospital deve-se repor, assim nunca vai faltar.
Sei que o primo dela e a sobrinha tem o mesmo tipo de sangue que o meu. Minha mãe e minhas duas tias também. Eles vieram no dia seguinte.
Fiquei mais dois dias no hospital. Sonhei que estava morrendo e que vultos escuros vieram me buscar. Novamente o desespero tomou conta da minha alma. Eu tinha vontade de chorar, mas não tinha forças, as lágrimas apenas caíam sem parar sobre meu rosto, molhando todo o travesseiro. Estava sem forças para me levantar, para falar, sem forças para viver. Sabia que a morte estava chegando e que eu iria para o inferno. Quanto desespero! Quanta dor! A agonia toma conta do nosso ser de uma forma que se eu pudesse me mataria ali naquela hora. Mas se eu me matar vou para o inferno mais rápido. Se de repente alguém errasse o remédio, então eu não estaria me matando, mas mesmo assim minha alma não estaria salva.
- Meu Deus o que eu faço?

Três dias internada. Recebi alta. Fui para casa. Bá fez sopa de letrinhas. Ela brincava comigo dando o macarrão e falando as letrinhas que estavam na pequena colher. Tinha mais água do que macarrão. De repente senti um gosto de sangue na boca. Minha gengiva começou a sangrar… eu estava apodrecendo…
O cheiro do meu quarto, nem com todo desinfetante do mundo tirava o fedor de morte. Um cheiro de podre… era eu…
Minha mãe me limpava com um pano o tempo todo. Passava creme hidratante na pele por causa do ressecamento. Mesmo assim eu fedia.
Vocês devem se perguntar do Felipe. Ele me deixou na primeira semana da quimioterapia. Disse que não iria suportar me ver sofrer. Um covarde que de fato não me amava. Foi usado só para me tirar da presença de Deus. Ele está namorando com outra menina. A casa onde iríamos morar agora é dela. Os móveis, ele vendeu e me deu uma parte do valor. Minha mãe compra remédios com esse dinheiro.

Dia de consulta. Coloquei o lenço azul, com uma blusinha azul clara e uma saia preta. Minha perna estava só osso e uma pele caída por cima dele, um horror. O calçado era uma rasteirinha rosa.  Eu passei batom, mas já não tinha lábios, apenas um risco como boca. Me perfumei com um cheiro maravilhoso de flores. Devia estar me preparando para o caixão…
Continua na próxima semana...

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